Mais de 100 entidades sindicais aderiram ao Fórum em Defesa da Liberdade Sindical, criado por iniciativa do Ministério Público do Trabalho do Paraná (MPT). A primeira reunião ocorreu em dezembro de 2017, e outros encontros já foram realizados em janeiro deste ano. O lançamento oficial está previsto para ocorrer no início de março, mas a articulação já está “a todo vapor”, como indica Alberto Emiliano de Oliveira Neto, procurador do Trabalho no Paraná e um dos idealizadores da ação. Segundo o membro do MPT, a iniciativa é inédita no Brasil.
De acordo com procurador, o Fórum será espaço para denúncias e discussões das práticas antissindicais cometidas por empresas ou pelo próprio empregador público (governos e empresas públicas). Além disso, servirá como “um mecanismo de provocação das instituições” que devem atuar nas denúncias, como o Ministério Público Estadual, Federal e o próprio MPT.
Para Oliveira Neto, a reforma trabalhista trouxe uma lista de mudanças prejudiciais à atuação dos sindicatos e que atentam contra a liberdade sindical.
Atualmente, cerca de 500 inquéritos tratam do tema no Brasil, de acordo com Oliveira Neto. “É pouco. Acho que o Ministério Público pode crescer e atuar mais efetivamente, Talvez essa seja uma das finalidades do Fórum, ou seja, atuar como setor de aglutinação dessas denúncias”, sinaliza o procurador, que também é vice coordenador nacional da Coordenadoria Nacional da Promoção da Liberdade Sindical.
Confira a entrevista completa com Oliveira Neto:
BDF: Qual é o objetivo do Fórum?
Alberto Emiliano de Oliveira Neto: O objetivo principal do fórum e promover a liberdade sindical a partir de uma narrativa construída pelo próprio movimento sindical. Ainda que o Ministério Público tenha legitimidade para tutelar a liberdade sindical, pois é uma das função do MPT atuar em prol da liberdade sindical. Mas, em que pese essa previsão de legitimidade, a ideia do Fórum é trazer as entidades sindicais para construir essa narrativa de tutela, para que não seja algo unilateral ou construído apenas e tão somente da perspectiva do Ministério Público, e que os próprios atores sindicais e as entidades que são titulares da liberdade sindical possam participar desse processo. E o mecanismo que a gente encontrou para permitir isso é no âmbito do Fórum, que é um espaço democrático, em que todos têm a possibilidade da fala, a partir disso construímos uma narrativa.
Há pontos da reforma trabalhista que podem abrir caminho para práticas antissindicais?
Vários. Eu posso listar aqui a previsão de acordos individuais sem a participação dos sindicatos; a ausência dos sindicatos na homologação das rescisões contratuais; a ausência do sindicato nas dispensa coletivas, em massa; o incentivo à arbitragem privada, em detrimento da atuação da entidade sindical; e também a questão do custeio. Ou seja, a reforma vem e aniquila as formas de custeio das entidades sindicais. Todo esse roll de modificações trazidas pela lei, na minha concepção, acabam por prejudicar a atuação dos sindicatos e, consequentemente, atentar contra a liberdade sindical.
O senhor avalia que há um movimento legislativo para dificultar a organização de greves?
É óbvio que quando você impede a atuação das entidades sindicais, tirando as fontes de financiamento, você acaba dificultando a atuação na forma de greve. Não tenha dúvida disso. É muito cedo para fazer um diagnóstico preciso do impacto da reforma trabalhista na atuação das entidades sindicais. O que temos, por ora, são previsões negativas, mas que ainda vão ter que se concretizar. A tendência é que o quadro não seja muito positivo. Daí a importância do fórum de construir estratégias de resistência.
Como a liberdade sindical está relacionada ao exercício da democracia?
A livre atuação das entidades sindicais é própria do regime democrático, ou seja, ainda que tenhamos o Estado como entidade central que executa as políticas públicas, é importante que os movimentos sociais, os sindicatos, tenham voz, justamente para defender as diversas narrativas que existem numa sociedade tão plural como a nossa. Ou seja, são vários interesses para a classe trabalhadora, interesses dos empresários, de comunidades indígenas, quilombolas e outros grupos, questões de gênero, que requerem a atuação livre dos movimentos sociais. E os sindicatos, como representantes dos trabalhadores, têm essa atuação destacadas no regime democrático. O que isso quer dizer? Se os sindicatos têm a sua voz calada, há um grave atentado não só a liberdade sindical, mas ao regime democrático. Os sindicatos precisam ter liberdade para atuar e se manifestar, pois isso diz respeito ao modelo que a Constituição Federal definiu para a sociedade brasileira. Ou seja, é um modelo de liberdade, de democracia, de livre atuação dos movimentos sociais.
Em que medida da reforma trabalhista, pautada pelo governo Temer e acatada pela maioria do Congresso, fragiliza a participação democrática dos sindicatos?
Na reforma trabalhista não foram acolhidas as manifestações de todas as partes interessadas. Se você for pensar numa reforma trabalhista, você tem o interesse da empresa, o da sociedade, do estado e dos trabalhadores também. São vários grupos que têm interesse no mesmo processo. Ao que parece, o resultado final da reforma trabalhista revisou tão somente os interesses dos empresários e de alguns segmentos do governo. Não vejo que a classe trabalhadora tenha tido seus pleitos acolhidos na reforma trabalhista, o que resulta, consequentemente, em um certo déficit democrático nesse processo.
Quando você faz uma modificação drástica na lei e dá prevalência apenas para um lado, ou apenas para alguns segmentos, em detrimento de outros, você cria um déficit democrático. É o que a gente enfrenta. E me parece que esse déficit democrático é algo que o Fórum pretende atacar. Ou seja, dar voz àquele grupo que não foi privilegiado e atendido na reforma trabalhista, e, a partir disso, construir uma narrativa que possa ser veiculada até como um movimento de contraponto, um movimento de resistência à qualquer tentativa de retrocesso social.
Fonte: Brasil de Fato / Ednubia Ghisi