Para a Coordenadoria Nacional de Promoção da Liberdade Sindical (Conalis) do Ministério Público do Trabalho (MPT), a Medida Provisória 873/2019, editada pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, desrespeita a Constituição e tratados internacionais. A Nota Técnica 3, emitida dia 14/5, regulamenta os pontos que foram desrespeitados pelo atual governo.
A MP em questão, editada no dia 1º de março, traz novas regras para a contribuição sindical, como a proibição do desconto em folha e a requisição de autorização prévia individual, independente de acordos coletivos. Além disso, determina que a contribuição deve ser feita por meio de boletos bancários.
Na Nota Técnica 3, a Conalis afirma que a medida atenta contra “a autonomia privada coletiva, a liberdade sindical e a livre negociação”.
Vejamos o que o Conalis alega:
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Os acordos e convenções coletivas de trabalho firmados antes da publicação da MP 873 não podem ser por ela atingidos, em respeito ao direito adquirido e ato jurídico perfeito (inc. 36 do art. 5º CF/88), bem como as cláusulas acordadas na vigência da MP, por força da autonomia privada coletiva e do contido no art. 611-A, da CLT.
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A negociação coletiva e a liberdade sindical integram os quatro princípios da Declaração da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho (1998), documento de grande importância para a consolidação do trabalho decente em todo mundo, um dos 17 objetivos de desenvolvimento sustentável da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas.
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A assembleia de trabalhadores regularmente convocada é fonte legitima não só para a estipulação de novas condições de trabalho (art. 611), como também para fixar a contribuição destinada ao custeio das atividades sindicais, podendo dispor sobre o valor, a forma do desconto, a finalidade e a destinação da contribuição (CLT, art. 513, e), em conformidade com o art. 2º da Convenção 154 da OIT, ratificada pelo Brasil, que trata das medidas de incentivo à negociação coletiva.
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As cláusulas de segurança sindical “closed shop” e “maintenance of membership” são expressamente vedadas pela Constituição (art. 8º, 5). Em outras palavras, o trabalhador não pode ser obrigado a filiar-se ou manter-se filiado ao sindicato, para conseguir ou garantir um emprego.
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Diferentemente, a Constituição não veda a cláusula “agency shop”, entendida como aquela que estabelece o desconto de contribuição dos trabalhadores não filiados, desde que tenham sido abrangidos pela negociação, nos termos do entendimento consolidado perante o Comitê de Liberdade Sindical da OIT (§ 321-327).
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Os trabalhadores abrangidos pela negociação coletiva devem participar do financiamento desse processo, sob pena de inviabilizar e fragilizar a atuação sindical, bem como desincentivar novas filiações. A cobrança do não associado abrangido pela negociação coletiva não viola a liberdade sindical negativa, pois não resulta em necessária ou obrigatória filiação ao sindicato, assegurado o direito de oposição.
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O regramento do boleto bancário (CLT, 582), em substituição ao desconto em folha, tem o potencial de inviabilizar a atuação sindical, e de fragilizar o sistema de financiamento dos sindicatos, cuja missão é coletiva e não individual.
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A regra do boleto bancário é inconstitucional por contrariar a literalidade do inciso 4 do art. 8º, que autoriza expressamente o desconto em folha da contribuição confederativa, fixada por assembleia sindical, e por ferir o princípio da isonomia de tratamento (CF, art. 5º, caput) das pessoas jurídicas, na medida em que cria regra que dificulta o recolhimento das contribuições tão somente para as entidades sindicais, mantendo outras sistemáticas do desconto em folha, a exemplo dos empréstimos e financiamentos bancários, contratados pelos trabalhadores junto às instituições financeiras.
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As referidas alterações da MP 873 atentam contra a autonomia privada coletiva, a liberdade sindical e à livre negociação (CF, art. 8º, caput, 1 e 6 e Convenções n. 87, 98 e 154 da OIT), pois impedem que os sindicatos estabeleçam livremente em seus Estatutos, ou negociem e regulem formas de financiamento e de desconto em acordos e convenções coletivas de trabalho, configurando grave e vedada interferência e intervenção do Estado na organização sindical, razão pela qual não pode prevalecer ante a sua flagrante inconstitucionalidade e inconvencionalidade.
NOTA TÉCNICA 3 NA ÍNTEGRA, CLIQUE AQUI.